segunda-feira

Fora de Nossas Mentes - Parte #2


Ah, aquele brilho eterno de uma mente sem lembranças...



Matthew acorda sentindo a camiseta colando nas costas e o sol batendo em seus olhos, fazendo-os arder. Olha em volta e começa a se sentir frustrado e horrivelmente confuso. Está dentro de um carro, aparentemente seu próprio carro, estacionado no meio do nada. Literalmente. Não consegue entender o que está acontecendo ou como fora parar lá. E, o pior de tudo, não faz a menor ideia de quem ele é.
Baixa o quebra sol do carro, na esperança de olhar o espelho, e uma identidade cai. “Ah, então esse sou eu?”, pensa. Seu rosto é condizente com a foto, então só pode ser ele mesmo. Matthew John Elias, nascido em 21 de outubro de 1982 em Dallas, no Texas. Isso dá uns... Não consegue responder, e sua cabeça dói com isso. Ele não tem a menor noção de que dia, mês ou ano é, muito menos que horas são. Procura pela filiação no documento e o espaço está em branco. Dentro de todos os fatos sem sentido dos últimos minutos, o de não ter pai ou mãe é o mais estranho de todos.
Não sabe exatamente o que fazer. Ficar ali parado não parece uma boa opção, então resolve fazer o carro sair do lugar e andar. É incrível a capacidade do corpo de responder aos comandos automáticos, sem precisar da força da mente para se lembrar. Se ele está em um carro, no banco do motorista, ele sabe dirigir.
Na estrada, andando à passos imprecisos, Matthew se depara com uma figura que o faz esquecer de seus próprios problemas. Uma menina, uma mulher, que de longe parece indefesa, além de estar visivelmente perdida. Mas ele não é a melhor opção para oferecer ajuda no momento. Acaba por seguir seu caminho.
Dirige por o que parecem ser horas, mas o barulho vindo de sua barriga acaba sendo mais forte. Isso é fome, Matthew tem certeza. O caminho acaba o levando a um bar à beira da estrada. Nada ainda lhe parece familiar, mas já começa a se acostumar com essa situação. Como uma criança que dá seus primeiros passos. Mas a questão é que nem ao menos consegue se lembrar de sua própria infância.
Senta-se ao balcão do bar e pede qualquer coisa para matar a fome. A garçonete, que o olha intrigada, traz um prato de restos do almoço dos funcionários, o qual não demora a ser devorado com fervor por Matthew.

_ Vai com calma. Ainda tem mais comida de onde veio essa.
_ Qual é o nome disso?
_ Aqui isso se chama arroz com bife.
A garçonete volta a trabalhar, mas se perde em seu olhar pelo intrigante rapaz. Ele tem um jeito de criança, mas corpo e voz de homem. Olhos azuis e cabelos negros. Já pensava na possibilidade de levá-lo para casa, ensinar-lhe umas coisas, mas os caras da mesa 12 não param mais de fazer barulho. “Isso vai ter que ficar para mais tarde”.
Saboreando seu prato de comida, Matthew mal demora a perceber a presença de uma jovem, dois bancos ao lado do seu. Ela segura seu copo de cerveja sem vontade, mas olhava para o conteúdo com um interesse que é só seu. Não demora a perceber que essa é a mesma garota que estava caminhando na estrada uns minutos antes dele chegar. Mas como foi que ela conseguiu chegar primeiro?

_ Bebendo para esquecer?
_ Bebo para me lembrar.
_ Conseguiu algum resultado?
_ Não!
_ É uma pena. Acho que era exatamente disso que eu precisava. – A garota se vira para ele pela primeira vez, sem demonstrar qualquer emoção, ainda sem entender direito o que era aquilo tudo.
_ Perdeu alguma coisa importante, rapaz?
_ Minha memória. Não que eu ache que isso seja realmente importante, se não, não a teria perdido. E você, o que perdeu?
_ Minha memória também. Mas sinceramente, tenho a sensação de que não vai valer a pena eu tentar descobrir quem eu era. O motivo para eu perder a memória deve ter sido muito forte. Acho mesmo que eu não queria ter que acordar com lembrança alguma.
_ Quer saber garota, acho que você e eu aqui temos os mesmos problemas. – ele estende a mão livre para ela, na intenção de cumprimentá-la – Matthew... Se é que esse é meu verdadeiro nome.
_ Pode me chamar de Melissa... Eu acho. – e ela sorri verdadeiramente. Seu primeiro sorriso em dias. Os dois tinham ainda muito que conversar.




““How happy is the blameless vestal’s lot!
The world forgetting by the world forgot
Eternal shine of the spotless mind
Each pray’r accepted and each wish resign’d””
Alexandre Pope (Eliose to Abelard)




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